quarta-feira, 8 de novembro de 2023

A História de Portugal Reinventada

 Encalhei com este texto por aí. 

Com a crise política que se instalou ontem no país, olhemos para o passado e avaliemos tudo o que nos impingiram nos manuais. 

Valha-nos o nosso sorriso!

Tudo começou com um tal Henriques que não se dava bem com a mãe e acabou por se vingar na pandilha de mauritanos que vivia do outro lado do Tejo. Para piorar ainda mais as coisas, decidiu casar com uma espanhola qualquer e não teve muito tempo para lhe desfrutar do salero porque a tipa apanhou uma camada de peste negra e morreu.
  Pouco tempo depois, o fulano, que por acaso era rei, bateu também as botas e foi desta para melhor. Para a coisa não ficar completamente entregue à bicharada, apareceu um tal João que, ajudado por um amigo de longa data que era afoito para a porrada, conseguiu pôr os espanhóis a enformar pão e ainda arranjou uns trocos para comprar uns barcos ao filho que era dado aos desportos náuticos. De tal maneira que decidiu pôr os barcos a render e inaugurou o primeiro cruzeiro marítimo entre Lisboa e o Japão com escalas no Funchal, Salvador, Luanda, Maputo, Ormuz, Calecute, Malaca, Timor e Macau .
  Quando a coisa deu para o torto, ficou nas lonas só com um pacote de pimenta para recordação e resolveu ir afogar as mágoas, provocando a malta de Alcácer-Quibir para uma cena de estalo. Felizmente, tinha um primo, o Filipe, que não se importou de tomar conta do estaminé até chegar outro João que enriqueceu com o pilim que uma tia lhe mandava do Brasil e acabou por gastar tudo em conventos e aquedutos. Com conventos a mais e dinheiro menos, as coisas lá se iam aguentando até começar tudo a abanar numa manhã de Novembro. Muita coisa se partiu. Mas sem gravidade porque, passado pouco tempo, já estava tudo arranjado outra vez, graças a um mânfio chamado Sebastião que tinha jeito para o bricolage e não era mau tipo apesar das perucas um bocado amaricadas.
  Foi por essa altura que o Napoleão bateu à porta a perguntar se o Pedro podia vir brincar e o irmão mais novo, o Miguel, teve uma crise de ciúmes e tratou de armar confusão que só acabou quando levou um valente puxão de orelhas do mano que já ia a caminho do Brasil para tratar de uns negócios. A malta começou a votar mas as coisas não melhoraram grande coisa e foi por isso que um Carlos anafado levou um tiro nos coiratos quando passeava de carroça pelo Terreiro do Paço. O pessoal assustou-se com o barulho e escondeu-se num buraco na Flandres onde continuaram a ouvir tiros mas apontados a eles e disparados por alemães. Ao intervalo, já perdiam por muitos mas o desafio não chegou ao fim porque uma tipa vestida de branco apareceu a flutuar por cima de uma azinheira e três pastores deram primeiro em doidos, depois em mortos e mais tarde em beatos. Se não fosse por um velhote das Beiras, a confusão tinha continuado mas, felizmente, não continuou e Angola continuava a ser nossa mesmo que andassem para aí a espalhar boatos. Comunistas dum camandro! Tanto insistiram que o velhote se mandou do cadeirão abaixo e houve rebaldaria tamanha que foi preciso pôr um chaimite e um molho de cravos em cima do assunto. Depois parece que houve um Mário qualquer que assinou um papel que nos pôs na Europa e ainda teve tempo para transformar uma lixeira numa exposição mundial e mamar duas secas da Grécia na final.

 E o Cavaco e o Sócrates?

 O Cavaco foi com o Pai Natal e o Sócrates e o palhaço no combóio ao circo.

quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Tempos Difíceis

 Desde há dois anos que andamos em sobressalto. 

Primeiro foi a pandemia que virou a nossa do avesso. E, apesar dos arco-íris do "Vai ficar tudo bem", a verdade é que as nossas rotinas e hábitos foram configurados para um antes de e um depois de. 

O início de 2022 trouxe alguma acalmia. Mas em fevereiro chegou a guerra. No tempo de vida da Europa unida, nunca tinha havido uma guerra tão chegada às suas fronteiras externas. 

E a nossa vida tornou a guinar. Instalou-se a crise energética. Dispararam os preços de tudo e de mais alguma coisa. Para compor o cenário catastrófico, ronda a ameaça da agudização do conflito com o recurso ao armamento nuclear.

Ora bolas! A década de 20 deste século ainda criança começou bem e ... não se recomenda.

Uma guerra não contempla vencedores ou vencidos em termos de sofrimento, dor e perda. Os mortos civis têm pai, mãe e filhos, e os mortos militares também. Qualquer que seja a nossa perspetiva ou opinião sobre as causas, fundamentos e argumentos dos interventores, não podemos nem devemos perder de vista que em ambos os lados há tragédias.

Erich Marie Remarque plasmou no livro "A Oeste Nada de Novo" o desencanto dos jovens recrutas imbuídos de patriotismo perante a realidade da frente de batalha.

Aqui deixo a leitura do início da obra.


quinta-feira, 3 de novembro de 2022

As Redes e a Comunicação

 Nos últimos trinta anos, a necessidade de ampliar a comunicação entre as pessoas tornou fértil o terreno das redes sociais.

E é no subsolo deste conceito que entram em cena as minhas raízes familiares, formatadas no mar, e nas ditas. Tornámo-nos cardumes vagueando pelos mares intercontinentais, explorando as redes, num entra e sai para quebrar a ociosidade.

No início, a rede era pequena. Dominava a pesca à linha ou ao corrido nos mails que nos inundavam a caixa com carradas de powerpoints e fotografias de tudo e mais alguma coisa.

Quase em simultâneo encetámos a descoberta do caminho digital para as mensagens de telemóvel, com figurinhas engendradas nos símbolos do teclado e textos de correntes morais que incitavam à partilha.

Eis senão quando aparece a primeira rede verdadeiramente social, o Hi5. Foi assim uma espécie de arte da xávega, limitada ao tamanho da rede, à profundidade e às ferramentas. O cardume arrumava-se por potências de 5, num esquema espiral, onde o nome contava pouco numa competição com o avatar mais apelativo e destravado.

Já o século tinha deixado a idade da lactância, apareceu o Facebook. A rede era de malha larga e o cardume desenvolveu uma variante da palavra amizade. A fotografia passou a ser obrigatória para se reconhecerem os amigos e as amigas. Mesmo que não se falem na rua ou no bairro, nesta rede todos partilham a retenida e o cerco cresce à conta das sugestões do algoritmo.

Já o oceano da comunicação se começava a compor de cardumes variados, alguns dos quais desconhecidos, apareceu o Twitter, uma rede mais larga e robusta para cardumes mais sofisticados e opinativos. Juntou peixes pequenos com peixes grandes. A hierarquia da cadeia alimentar ditou o elitismo de uns e a exacerbação no discurso de outros. Instalou-se um progressivo caos nas espécies.

O Instagram forneceu aos cardumes o espelho para se mirarem. Desde as mais rotineiras atividades como comer ou dormir às mais esquisitas ou mirabolantes aventuras, o cardume deixou-se apanhar pelos cliques das redes de emalhar. muito finas e transparentes, para dar a conhecer o seu modo de vida.

Os cardumes mais aventureiros e apreciadores de iscos elaborados encontraram no Tinder a rede apropriada para a continuação da espécie. A comunicação entrou no campo da relação íntima onde só importa o que é visível aos olhos. Valorizou-se o brilho da escama, o vermelho da guelra, a cor da barbatana, seja peitoral ou caudal.

Atualmente, e fazendo jus às preocupações com o meio ambiente e aos gritos de "Salvem o Planeta!", proclamou-se a biodiversidade e a rede afrouxou os seus nós, flexibilizou a malha e espraiou-se para as margens secas e arborizadas, permitindo a miragem da fusão do meio aquático com o terrestre. É a época da rede Mastodont. Libertária, sem bóias nem chumbos, oferece ao cardume a escolha de navegar ao sabor da maré e do vento. 

Certamente outras se redes se seguirão, a menos que os cardumes desistam de comunicar e se enfiem em cavernas silenciosas.

quarta-feira, 2 de março de 2022

Em Suspenso

 


 Nestes últimos dias, andamos em bicos de pés. Não porque queiramos ser silenciosos mas porque estamos em suspensão.

Dois anos de pandemia, entre confinamentos, estados de emergência, ondas de grandes números e abrandamentos, orientaram os nossos passos, as nossas profissões, as nossas vidas. Ficámos suspensos do alívio das restrições, da inevitabilidade de apanharmos o vírus e da dúvida do 'será que acabou?'

Nesta maré de perspetivas, eis que o mundo se confronta com a insanidade de um líder político. Conflitos antigos desaguaram numa invasão de território, de fuga das populações, de convergência de atitudes das nações.

Vladimyr Putin, o todo poderoso russo, diz que a Ucrânia não é um país, não tem história e que só existe porque é um produto russo. Lesinsky, o presidente ucraniano eleito democraticamente pelos seus conterrâneos, reivindica a liberdade de ser um país democrata e pensar pela sua cabeça. 

Começou a lavra de um insano político e a defesa da colheita  de um jovem chegado à política há pouco tempo mas carregado de vontade própria.

A incursão planeada para durar 3, 4 dias, 5 no máximo, encontrou uma resistência popular e uma ajuda europeia nunca vistas.

Estamos em suspenso. Para dar um fim à guerra, o insano russo carregará no botão nuclear? Passaremos de espectadores ansiosos a vítimas sem esperança?

 


 



domingo, 17 de outubro de 2021

O Poder da Palavra

 

 Você fala sozinho? Especialistas garantem que o hábito é normal e faz bem à  saúde

 

É incrível o poder da palavra.
A Palavra é o que nos distingue do resto da criação divina. Pela palavra comunicamos.
Existem três categorias de palavras: as que se pensam, as que se dizem e as que se calam; e dentro destas existem outras variedades. As palavras são como as árvores. Ramificam-se.
Como diz o poeta, há palavras que nos beijam como se tivessem boca.... São palavras de simpatia, amizade, compreensão, carinho, paixão, amor. Precisamos delas para nos sentirmos vivos, para perspetivarmos o mundo, para nos posicionarmos na vida, para estarmos bem com os outros e connosco próprios.
Há palavras que gritam. Cada pensamento, som ou gesto é raiva e ódio. Não precisamos delas pois conflituam-nos de tal maneira que baralham a lucidez e o discernimento.
Também há as palavras inúteis, não porque a inutilidade resida na palavra, mas porque não são necessárias para os momentos. A extrema alegria ou a morte tornam-nas inúteis.
Inúteis são, também, as que tentamos dizer a alguém que cala as palavras. Quem cala palavras não gera comunicação. Produz reticências, silêncios , dúvidas.
Por fim há as palavras mal-entendidas. Podem-se pensar, dizer ou calar mas não cumprem a missão de comunicar. Partem do seu destino com uma intenção mas chegam irreconhecíveis.
São tão perigosas como incontroláveis. Perigosas porque distorcem a realidade e arruínam relações. Incontroláveis porque quando partem de nós carregam o nosso sentir, levam instruções expressas, mas confundem-se e transmutam-se, devido a factores externos.
Infelizmente, parece ser esta última variedade a que mais existe por aí. Utilizamos uma amálgama de palavras, das várias categorias e variedades e não nos damos conta da importância da escolha. Os factores externos somos nós próprios. Uma atitude impensada, um gesto deslocado e toda a palavra que de nós sai fica mirrada, seca, espalhada no deserto da incompreensão.
O que nos distingue do resto da criação divina torna-nos, às vezes, infelizes.


terça-feira, 12 de outubro de 2021

Acertos Definitivos

 Ficheiro:Inter-grav.jpg – Wikipédia, a enciclopédia livre

 

Li algures na internet que:

« Em 1582, durante o papado de Gregório XIII (Ugo Boncampagni, 1502-1585), o equinócio da Primavera já estava ocorrendo em 11 de Março, antecipando muito a data da Páscoa. Daí foi deduzido que o ano era mais curto do que 365,25 dias (hoje sabemos que tem 365,242199 dias). Essa diferença atingia 1 dia a cada 128 anos, sendo que nesse ano já completava 10 dias. O papa então introduziu nova reforma no calendário, sob orientação do astrónomo jesuíta alemão Christopher Clavius (1538-1612), para regular a data da Páscoa, instituindo o Calendário Gregoriano.

Essa reforma foi  publicada na bula papal Inter Gravissimas em 24.02.1582, e determinava que fossem tirados 10 dias do ano de 1582, para recolocar o Equinócio da Primavera em 21 de Março. Assim, o dia seguinte a 4 de Outubro de 1582 (quinta-feira) passou a ter a data de 15 de Outubro de 1582 (sexta-feira). »

 

Não sendo nova para mim (e para outros) esta informação, dou comigo a pensar como seria, nos dias que correm, acontecer tal facto.

Provavelmente era o caos, a começar pelas programações das TV's no que a telenovelas diz respeito. Depois seguir-se-iam outras "chatices", nomeadamente, para os aniversariantes desses desaparecidos 10 dias, que ficariam privados das prendas e das festas, já para não falar dos casamentos ou dos divórcios marcados antecipadamente para essa data. E os cheques a descontar nesse intervalo de tempo? Lá se iam os pagamentos e os recebimentos. A falta que esses dez dias nos iriam fazer era qualquer coisa do além!

Só num pormenor estariam na proporção correta: no corte do ordenado - menos dinheiro ficaria a condizer com menos dias de trabalho! É pena que este encurtamento tenha sido há 500 anos e para um mês só.

Há 5oo anos, estas deslavadas linhas estariam a navegar nas profundezas do Tempo, afundando-se na sua não-existência.

  


quarta-feira, 1 de setembro de 2021

A Comunicação Incomunicável

 Por ter uma opinião muito semelhante, aqui deixo o registo de António Barreto sobre as nossas televisões:

“É simplesmente desmoralizante. Ver e ouvir os serviços de notícias das três ou quatro estações de televisão é pena capital. A banalidade reina. O lugar-comum impera. A linguagem é automática. A preguiça é virtude. O tosco é arte. A brutalidade passa por emoção. A vulgaridade é sinal de verdade. A boçalidade é prova do que é genuíno. A submissão ao poder e aos partidos é democracia. A falta de cultura e de inteligência é isenção profissional.

Os serviços de notícias de uma hora ou hora e meia, às vezes duas, quase únicos no mundo, são assim porque não se pode gastar dinheiro, não se quer ou não sabe trabalhar na redacção, porque não há quem estude nem quem pense. Os alinhamentos são idênticos de canal para canal.

Quem marca a agenda dos noticiários são os partidos, os ministros e os treinadores de futebol. Quem estabelece os horários são as conferências de imprensa, as inaugurações, as visitas de ministros e os jogadores de futebol.

Os directos excitantes, sem matéria de excitação, são a jóia de qualquer serviço. Por tudo e nada, sai um directo. Figurão no aeroporto, comboio atrasado, treinador de futebol maldisposto, incêndio numa floresta, assassinato de criança e acidente com camião: sai um directo, com jornalista aprendiz a falar como se estivesse no meio da guerra civil, a fim de dar emoção e fazer humano.

Jornalistas em directo gaguejam palavreado sobre qualquer assunto: importante e humano é o directo, não editado, não pensado, não trabalhado, inculto, mal dito, mal soletrado, mal organizado, inútil, vago e vazio, mas sempre dito de um só fôlego para dar emoção! Repetem-se quilómetros de filme e horas de conversa tosca sobre incêndios de florestas e futebol. É o reino da preguiça e da estupidez.

É absoluto o desprezo por tudo quanto é estrangeiro, a não ser que haja muitos mortos e algum terrorismo pelo caminho. As questões políticas internacionais quase não existem ou são despejadas no fim. Outras, incluindo científicas e artísticas, são esquecidas. Quase não há comentadores isentos, ou especialistas competentes, mas há partidários fixos e políticos no activo, autarcas, deputados, o que for, incluindo políticos na reserva, políticos na espera e candidatos a qualquer coisa! Cultura? Será o ministro da dita. Ciência? Vai ser o secretário de Estado respectivo. Arte? Um director-geral chega.

Repetem-se as cenas pungentes, com lágrima de mãe, choro de criança, esgares de pai e tremores de voz de toda a gente. Não há respeito pela privacidade. Não há decoro nem pudor. Tudo em nome da informação em directo. Tudo supostamente por uma informação humanizada, quando o que se faz é puramente selvagem e predador. Assassinatos de familiares, raptos de crianças e mulheres, infanticídios, uxoricídios e outros homicídios ocupam horas de serviços.

A falta de critério profissional, inteligente e culto é proverbial. Qualquer tema importante, assunto de relevo ou notícia interessante pode ser interrompido por um treinador que fala, um jogador que chega, um futebolista que rosna ou um adepto que divaga.

Procuram-se presidentes e ministros nos corredores dos palácios, à entrada de tascas, à saída de reuniões e à porta de inaugurações. Dá-se a palavra passivamente a tudo quanto parece ter poder, ministro de preferência, responsável partidário a seguir. Os partidos fazem as notícias, quase as lêem e comentam-nas. Um pequeno partido de menos de 10% comanda canais e serviços de notícias.

A concepção do pluralismo é de uma total indigência: se uma notícia for comentada por cinco ou seis representantes dos partidos, há pluralismo! O mesmo pode repetir-se três ou quatro vezes no mesmo serviço de notícias! É o pluralismo dos *papagaios no seu melhor!

Uma consolação: nisto, governos e partidos parecem-se uns com os outros. Como os canais de televisão.
*Papagaios não, chilreada de periquitos sim!*”